16 outubro 2006

Feliz dia da Saúde Mental, Dia da Criança e Dia do Professor

por Fábio Reynol

O que o Dia da Saúde Mental tem a ver com o Dia da Criança e com o do Professor? Seria mero acaso do destino que as três datas fossem colocadas no mês de outubro dentro do pequeno intervalo de cinco dias? Segundo minha teoria da conspiração foi um professor o criador das três. Quem já passou por uma sala de aula sabe: lecionar é tentar promover a saúde mental alheia em prejuízo da própria.

Dona Elzinha quase teve uma síncope nervosa ao tentar alfabetizar a nossa classe. Dona Neuzinha pediu afastamento após as frustradíssimas tentativas de inculcar a tabuada do sete na cabeça dos infantes. No segundo grau, tive um professor que suava frio toda vez que entrava na classe, e olhe que só foram duas vezes. Na terceira semana, a coordenadora educacional anunciou: "o professor de vocês fugiu". Recobrara a sanidade mental, o coitado.

O tempo passava, a faixa etária da classe subia e a dialética professor-aluno só se aprofundava. De um lado um inocente tentando dar comprovação científica ao valor do serviço que prestava (e pelo qual ganhava uma merreca). Do outro, um bando de rebeldes que nunca entendia por que só o professor era remunerado, já que era o único naquela sala presente de livre e espontânea vontade. Como convencer os jovens que estar sentado naquela carteira era melhor do que passar o dia na piscina do clube, na frente da televisão ou no campinho do bairro jogando pelada? É um exercício argumentativo fenomenal tentar mostrar que "estudando se vai longe" e desperdiçando o tempo no terrão de várzea o máximo que se pode conseguir é um salário milionário no Vasco, no São Paulo ou no Real Madrid.

No entanto o mais impressionante é que, na maior parte dos casos (graças a Deus), o professor acaba convencendo e a cada ano mais crianças saem das faculdades com seus canudos nas mãos. Muitos deles serão bem sucedidos na profissão, alguns vão pendurar o diploma na parede e vender bananas e acabarão mais ricos do que os primeiros. Outros ainda vão se graduar e mandar a sanidade mental às favas. Estes se tornarão professores.

Feliz Dia da Saúde Mental. Feliz Dia da Criança. Feliz Dia do Professor. Todo mundo já recebeu felicitações por pelo menos uma dessas datas, mas não há quem mereça as três ao mesmo tempo.

01 outubro 2006

Eleições - A democracia brasileira é uma criança raquítica

Não acredito que muitos brasileiros enxerguem a importância de um dia de eleições. Nessas manhãs, acordo com um enorme sentimento de grandeza. Nasci numa época em que não se escolhia o presidente da República. Ele era posto e imposto à nação, assim como muitos governadores e até prefeitos que eram nomeados por chefetes em Brasília que se julgavam no direito de escolher pelo povo.

Essa ilustre menina, a Democracia, demorou tanto a chegar por estas bandas que eu e meus pais quase votamos juntos pela primeira vez para presidente. Isso só não aconteceu por detalhes da legislação eleitoral que me excluiu daquele momento histórico apesar de eu ter 16 anos completos no dia do pleito. Mesmo assim, senti muito orgulho ao ver o Brasil saindo do rol de países ditatoriais nos quais povo é apenas gado em pasto de déspotas comunistas ou capitalistas.

Por ter vivido tanto tempo como rebanho, os brasileiros ainda se comportam como tal. Não há nada mais estranho ao Brasil do que o Congresso brasileiro. Um estrangeiro que quiser conhecer o país através de seus representantes no legislativo enxergará um país de doutores, latifundiários, empresários, banqueiros, grandes administradores de planos de saúde e representantes mistos destes e de outros lobbies menores. Onde estão os que representam as donas-de-casa, os caminhoneiros, as prostitutas, os estivadores, os desempregados, os camelôs, os operários, os estudantes, os favelados, os sem-teto e os sem-terra?

Por mais absurdo que pareça, a maioria de nós votará contra si mesmo no domingo. Cidadãos que darão seu apoio a congressistas que já legislaram e agiram contra os interesses de quem neles votou. Isso não é percebido porque a vida democrática para o brasileiro acontece somente a cada quatro anos. Portanto é natural e lamentável que quase ninguém se lembre em quem votou na última eleição.

Felizmente, a Democracia é uma criança paciente. Aos poucos, o acompanhamento da vida política do país vai aumentando. Depois de começar a guardar o nome de quem elegemos, vamos ver o que ele fez nas questões que mais nos interessam. Chegará o dia em que a Maria da Silva verá que aquele lugar em Brasília é dela e não do seu chefe, do coronel da fazenda, do dono da empresa, do dono do banco. Deixará o auto-menosprezo de lado e sairá da senzala para finalmente ocupar a casa grande.

Ao votar neste domingo, tenha em mente duas coisas. Primeiro, o que o seu candidato tem a ver com você? E depois, pense nos brasileiros que morreram lutando pela democracia para que você tivesse esse momento de escolha. Só isso, já nos faz ter uma alma do tamanho do nosso território.

Bons votos, Brasil. Você vai precisar.