25 maio 2007

O autógrafo

Esta foi feita sob encomenda para o Dia Internacional do Administrador de Pessoal. É isso mesmo. Esse cara tem um dia só pra ele, 03 de junho, e ainda por cima é internacional. Parabéns para o cara e pro pessoal que ele administra.

O Autógrafo

Como todos os dias depois do expediente, ele atravessou a rua e entrou na padaria da esquina. Enquanto esperava na fila da mortadela, um garoto de mais ou menos oito anos, com cara de bolacha, caderno e caneta na mão ficou encarando-o.
- O que foi? Disse incomodado.
- O que o senhor faz, hein? Perguntou o guri.
- Eu sou administrador de pessoal
- Ah! O senhor meio que... administra o pessoal, né?
- É.
- E o pessoal gosta de ser administrado pelo senhor?
- O que você quer, menino?
- Um autógrafo. É para a gincana lá da escola.
- Me dá aqui logo o seu caderno que eu autografo.
- Desculpe, mas a pessoa precisa ter alguma profissão importante. É regra da gincana.
- Tá dizendo que administração de pessoal não é importante?
- Eu nunca ouvi ninguém importante dizendo que é administrador de pessoal.
- Mas tem muito administrador de pessoal importante.
- Qual?
- Ora, você não conhece!
- Tá legal. Vou pegar o autógrafo do meu vizinho. Disse o garoto já virando de costas.
- Hei, volte aqui. O que esse cara faz?
- Ele é presidente da escola de samba do bairro.
- Eu faço a mesma coisa que ele, só que com muito mais gente.
- O senhor é sambista, é?
- Não, mas o trabalho é muito parecido. Eu sou o responsável por todos os integrantes. Contrato e mando embora todos, desde os da comissão de frente até o último carro alegórico.
- Só isso?
- Eu também organizo todos os ensaios, determino as fantasias e digo quando um baterista vira mestre de bateria.
- O senhor também sai com as passistas que nem o meu vizinho?
- Não! Eu até proíbo todo mundo de sair com as passistas no horário de trabalho.
- O senhor tem uma profissão muito esquisita.
- Qual é, garoto? Sem mim, ninguém trabalha em lugar nenhum! Dá aqui o seu caderno que eu autografo.
- Sei não...
- O que é isso? Eu sou muito importante lá na empresa. Todo mundo que quiser um aumento por lá tem que pedir a minha autorização. A minha assinatura vale ouro.
- Tá bom. – disse o menino abrindo o caderno ainda com cara de não conformado – Mas assine embaixo da folha porque em cima eu vou ter que fazer uma redação sobre a sua profissão.
- Tá legal, me dá o caderno logo...
Chegando em casa, o garoto jogou o caderno na mesa de jantar na frente do pai :
- Pronto, pai. Tá aqui a assinatura daquele cara que há cinco anos não te dá aumento. Agora eu quero a minha bicicleta nova!

14 maio 2007

Ainda vendendo palavras

Como elogio da própria boca é vitupério, uso a boca de outrem para me auto-elogiar.

O trecho abaixo é um "abre" para o Vendedor de Palavras, crônica minha publicada no espaço underground Lágrima Psicodélica. (http://lagrimapsicodelica.blogspot.com).

Aproveito o comentário para avisar que não publico crônicas em arquivos Power Point. Se alguém receber alguma mensagem com musiquinha melosa com paisagens ao fundo não foi obra minha. Uma campanha por um mundo menos piegas!

"O texto a seguir foi-me enviado por e-mail e há muito não me cai em mãos algo tão bom.

É ótimo quando nos enviam coisas assim e, melhor ainda, sem aquelas apresentações em pps com letras em profusão caindo em cascata à frente de uma paisagem e com Kenny G tocando ao fundo. São minutos intermináveis. Atualmente, basta o campo 'Assunto' apresentar títulos como 'Muito Lindo', 'Lindo Demais', 'Linda Mensagem' ou, pior, qualquer uma destas acompanhada de '(Com Som)' que mando pra lixeira sem dó. Mas não adianta, sempre aparece um outro contato que te envia novamente!

Aqui, nada mais temos que um texto inteligente, edificante, esclarecedor e exposto de maneira direta. E recheado de humor.

Um primor.

Sinceramente, não conheço o autor, Fábio Reynol, mas já vou pesquisar o cara.

Me vendeu suas palavras direitinho, o sacana."

09 maio 2007

Papa, excomungai nosso Congresso! Congresso, papai a grana de outro!


Pacato cidadão brasileiro,

Segure a sua carteira. Fique de olho na sua bolsa. Enquanto você estiver olhando o papa a abençoar o Brasil em sua cabine à prova de bênção na sacada do mosteiro, vai ter gente passando a mão no seu bolso. O Congresso Nacional, onde a deputação corre solta, está aproveitando os holofotes sobre o Sumo Pontíficie para sumir com parte do dinheiro público.

Vossas Insolências vão votar o aumento dos próprios salários. Claro que será em caráter de urgência porque nosso PIB explodiria se os congressistas continuassem a depender de propina para sobreviver. Esse despejo de grana vai inflacionar o mercado da corrupção e dificultar a vida de quem movimenta a economia deste país, os criminosos do colarinho branco.

Depois do aumento, não serão quaisquer R$100 mil que comprarão um deputadinho de segunda. O deputado e o senador com mais dinheiro legal (ainda que imoral) no bolso vão fazer disparar a cotação do congressista no mercado negro; o que tornará mais distante ao cidadão comum o sonho de obter o deputado próprio. É questão de tempo para ouvirmos o bicheiro no próximo grampo da Polícia Federal: “o preço da arroba do deputado gordo tá pela hora da morte!”

A movimentação para a votação prossegue sorrateira em Brasília, mas não poderia passar despercebida. A opinião pública estranhou ver os congressistas em plena atividade laboral. Que colocassem seus interesses acima dos da nação vá lá. Já estamos acostumados. Mas ao aparecerem para trabalhar (no puro sentido da palavra) deram muita bandeira e, é claro, levantaram inevitáveis suspeitas.

Justiça seja feita (no sentido figurado da palavra), a decisão de esconder o desavergonhado aumento debaixo da batina do papa foi motivada por boas intenções. O Congresso quis poupar os olhos da nação dessas cenas de sacanagem e de imoralidade, totalmente inapropriadas para um país decente.

Se for para aprontar atrás da moita, as TVs Congresso e Senado deveriam ir ao ar só depois das 23 horas. No horário nobre, poderiam transmitir a visita do papa, a final do Brasileirão e a cara-de-pau do presidente e de seu vice fingindo se preocuparem com o aborto.

Seu Papa, acudi-nos! Nossos representantes querem fazer conosco o que os padres de Boston fizeram com seus coroinhas!

02 maio 2007

Eu quero a minha mãe

A história de que Deus enviou seu filho ao mundo em uma missão de resgate suicida foi apenas uma versão divulgada à imprensa para disfarçar um pequeno conflito familiar no Céu. A verdade é que o menino desceu por sua conta e risco por um motivo muito mais humano do que divino: a inveja.

Numa tarde de verão, enquanto Deus Pai descansava em sua rede, Deus Menino escapuliu cá pra baixo pegando carona num raio de sol. Ao acordar, o Criador do universo encheu-se da mais divina das cóleras. "Onde está o garoto?", perguntou ao seu querubim-governanta ao não localizar seu rebento. "Creio que está na Terra, Senhor. Foi se esconder dentro do ventre de uma mulher." Demonstrando sua enorme sabedoria, o Onipotente resolveu não interferir. "Deixe-o lá. Quando voltar, nós conversaremos," vaticinou.

O garoto retornou 33 anos depois. O Pai o esperava acordado.

- Como foi o passeio? Perguntou o Velho.

- Maravilhoso! Respondeu enquanto despia as roupas mundanas e vestia as celestiais.

- Por que resolveste descer tão de repente, sem avisar? Comentou o Pai de braços cruzados, mas mantendo a calma como convém a um Deus compassivo.

- Me desculpa, Pai. Fiquei mordido de inveja de todos aqueles que têm alguém para chamar de mãe. Resolvi ter uma também – Confessou o rapaz demonstrando uma humildade digna de um Filho de Deus, enquanto estendia uma xícara de chocolate quente para apanhar uma nuvem de chantili.

- Mas por que numa casa de carpinteiro? Tu poderias ter nascido príncipe! – Comentou o Pai olhando para todo aquele chantili.

- Queria aprender teu ofício, Pai. – disse o Rapaz com uma crosta de chantili no bigode - Como tu, queria saber fazer aquele magnífico berço que os homens chamam de mãe.

- E o que aprendeste?

- Que as mães são muito mais do que isso. Depois de carregar seus filhos no ventre, elas cuidam deles eternamente. Quando pequenos, elas acordam à noite para tratar suas dores, os alimentam mesmo quando elas mesmas não tenham o que comer, participam de suas brincadeiras e lhes dão aconchego. Depois que crescem, os filhos recorrem à mãe sempre que precisam de um colo.

- Aprendeste tudo isso com essas mulheres?

- Mãe não é apenas uma mulher, é um lugar para o qual as crianças de zero a 50 anos retornam quando querem saber o que colocar numa picada de abelha ou simplesmente para comer novamente a torta da infância. Aquele que guarda a memória da mãe, mantém viva em si a criança que é, mesmo que tenha 90 anos de idade.

- Foi tua mãe que te ensinou tudo isso?

- Ela agüentou minhas estripulias, puxou minhas orelhas, me educou, apoiou meus sonhos e esteve ao meu lado até nos piores momentos.

- E então? Sabes agora como projetei as mães?

O Rapaz Deus lambeu o enorme bigode de chantili olhando para o Céu, ou seja, para os lados. Ficou por um momento pensativo saboreando o chantili com o restinho do chocolate e arriscou:

- Suponho que aquilo que os homens resumem na palavra "mamãe" seja uma altíssima concentração do teu infinito Amor encerrada numa alma feminina. É isso?

- Tu o dizes!

- Hei! Essa fala é minha!