19 julho 2007

Mamodecobra - Parte II - Dissimulação

Pincei do comecinho do Mamodecobra (Manual da Moderna Corrupção Brasileira) este importantíssimo capítulo que trata de uma questão premente no cenário corruptório atual: a dissimulação.

Capitulo 1357
Dissimular é preciso
dizer não é preciso

Eis um predicado indeclinável do corrupto desde o tempo em que a corrupção é corrupta, a dissimulação.

A cara-de-pau ou cara-lisa vai sendo endurecida com o tempo e deve ser conservada com vernizes especiais de falsos pudores e com chiliques moralistas convincentes.

A verossimilhança que a dita cara deve apresentar tem que ser diretamente proporcional à falcatrua que ela vai esconder. Desse modo, uma cara de "não-pedi-para-o-lobista-pagar
-o-táxi-dessa-senhora" não convence se for utilizada no lugar de outra de "não-tenho-nada-a-ver-com-os-milhões-desviados-dessas-plataformas". Do mesmo modo uma cara de "fiz-minha-fortuna-enquanto-ainda-era-engraxate" soa exagerada, e portanto suspeita, quando empregada no lugar da "a-licitação-do-cafezinho-foi-feita-dentro-dos-trâmites-legais". Níveis diferentes de roubalheira exigem diferentes graus de dissimulação.

Vejamos alguns exemplos:

- Como o senhor explica o caos aéreo brasileiro?
Resposta verdadeira:
- Nossa incompetência gerencial aliada ao desvio crônico de verbas do setor, somados ao acúmulo de omissões dos governos passados e agravada pela falta de vontade política atual explicam perfeitamente o quadro.
Resposta correta:
- Nossa nação atingiu tamanho grau de desenvolvimento que, de repente, todos resolveram viajar de avião ao mesmo tempo sobrecarregando o sistema.

- O que a senhora tem a dizer aos passageiros que esperam horas nos aeroportos?
Resposta verdadeira:
- Não se sintam culpados. As opções na última eleição não eram tão melhores do que este governo.
Resposta correta:
- É o custo do progresso. Daqui pra frente mais gente vai viajar de avião e deixar os obsoletos automóveis nas garagens.
Resposta de um especialista (em sexo):
- Já que o estupro é inevitável...

Unindo o útil ao prazeroso
Quando falta matéria-prima dissimulatória é recomendável encobrir uma falta legal com outra, de cunho moral. Expliquemos:
Se for desviar quantias propinatórias vultosas, torna-se interessante usar uma relação extra-conjugal como cortina-de-fumaça. Caso descubram a falcatrua, jogue no ventilador a pulada de cerca.
- O dinheiro da pensão era do senhor ou foi pago pela empreiteira?
- Foi um momento de fraqueza, a moça se insinuou...
- Como o senhor explica o caso com essa moça?
- Minha mulher já me perdoou por isso.
- E de onde veio o dinheiro de sua fortuna?
- Minha mulher já me perdoou por isso também!

E atenção: se descobrirem a dissimulação, não pense duas vezes, dissimule novamente:
- O senhor acha correto usar favores de lobistas?
- Meu Deus do Céu! Agora eu vou ser julgado por ter dado uma bimbadinha fora do casamento?

Se você estiver do outro lado, na bancada da oposição, é crucial comentar a questão como se nunca tivesse sido governo. Vista aquela cara de inconformismo:
- Isso é uma pouca vergonha jamais vista na história deste país!

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