01 junho 2007

Como escrever uma carta de amor

Nesta época do ano, às vésperas do Dia dos Namorados, renasce a mesmice, viceja a falta de originalidade e resplandece os chavões “minha vida sem você...”, “amo mais do que tudo...”, “I love you, baby...” Afinal, tirar flores diferentes do mesmo canteiro a cada ano não é mole. Se você trocou de namorado(a) há menos de um ano, pode lançar mão de um recurso eficiente e de extremo mau gosto: usar a mesma mensagem enviada ao “ex” no ano passado para o novo parceiro. Àqueles, porém, que quiserem dizer a mesma coisa com palavras completamente diferentes, dedico esta modesta receita de declaração de amor.

Nesta atividade estão excluídos recursos narco-etílico-inspiradores que, apesar de mostrar certa eficácia, podem causar dependência além de produzirem frases só inteligíveis para os que fizerem uso dos mesmos subterfúgios. Mantida, pois, a sobriedade, vamos ao trabalho.

Ingredientes

Os românticos vão me desculpar, mas só amor não basta para fazer uma carta de Dia dos Namorados. É preciso um algo a mais, um veículo para a sua mensagem, uma pipa para o vento da sua criatividade, uma carruagem para levar seus nobres sentimentos, um altar para imolar as palavras, ou seja, você vai precisar de papel e caneta. Porém, atenção: se sua letra for tão bonita quanto um ensaio sexy do Ronaldinho Gaúcho, não pense duas vezes, recorra à dupla computador e impressora.

Ter um destinatário ajuda. Entretanto, o fato de não ter namorado(a) não impede a elaboração de uma carta de amor. Todos saímos de fábrica com um modelo idealizado do amor. Não sabemos explicá-lo, mas até o mais distraído dos mortais conhece o “jeitão” dele. Vá até esse compartimento interior, desatarraxe o modelo e tire dele suas palavras de amor.

Preparo

Escreva-as mesmo se não houver ninguém para recebê-las agora. O texto, se guardado em local fresco e seco, terá validade indeterminada e poderá servir vários destinatários contanto que o namorado em exercício não desconfie estar recebendo palavras de segunda-mão.

Munido desse molde de amor, papel e caneta, tranque-se num lugar tranqüilo (até banheiro está valendo). Pense em tudo que lhe dá prazer: novela, futebol, cachaça, cinema, cama, sonhos, nuvem, poesia, dança, chá, praia, montanha, árvore, chocolate, chácara... Cheiro de mar, de terra molhada, de chuva no chão, de brinquedo novo, de brisa de lagoa, de perfume antigo, de banho fresco... Ouça pássaros, canções de amor, vento passando, uma voz bonita, o silêncio. Se nenhuma palavra lhe vier à cabeça, se os sonhos ficaram mais fortes e se deu uma vontade louca de sair beijando o mundo, você se encontrou.

Diga a esse seu recém-conhecido “eu” o quanto você o admira e que falta fazia a consciência da sua presença. Gente de mal de si mesma, ensimesma-se, abrocha-se e murcha. Regue seu jardim de paz e adube seu coração com liberdade para não sufocar depois o canteiro de outrem com o modelinho quadrado e reduzido que você tinha do amor.

Finalmente, você ficará espantado ao perceber, de repente, que criou as palavras mais extraordinárias e originais sobre o amor:
“EU AMO VOCÊ!”

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